Defesa prévia e prerrogativa de foro - 2
A Primeira Turma, por maioria, resolveu questão de ordem no sentido de deferir “habeas corpus” de ofício para trancar ação penal por ausência de justa causa e inépcia da denúncia.
Na ação penal, discutia-se nulidade processual em face do recebimento de denúncia sem defesa prévia e da não observância da prerrogativa de foro conferida a prefeitos (CF, art. 29, X).
No caso, foi ajuizada ação penal contra o então prefeito, hoje deputado federal, e outros, pela suposta prática do delito de fraude em licitação pública, previsto no art. 90 da Lei 8.666/1993 e, também, pelo crime de responsabilidade, disposto no art. 1º do Decreto-Lei 201/1967.
O juízo de origem recebeu, primeiramente, a denúncia quanto ao crime definido no art. 90 da Lei 8.666/1993 e determinou a notificação dos acusados para apresentarem defesa escrita contra o crime de responsabilidade, nos termos do art. 2º, I, do Decreto-Lei 201/1967 — v. Informativo 854.
A Turma afirmou que o prefeito detém prerrogativa de foro, constitucionalmente estabelecida. Desse modo, os procedimentos de natureza criminal contra ele instaurados devem tramitar perante o tribunal de justiça (CF, art. 29, X). Observou, também, que não houve submissão das investigações ao controle jurisdicional da autoridade competente. Além disso, a denúncia, ao arrepio da legalidade, fundou-se em supostas declarações, colhidas em âmbito estritamente privado, sem acompanhamento de qualquer autoridade pública (autoridade policial, membro do Ministério Público) habilitada a conferir-lhes fé pública e mínima confiabilidade.
Ressaltou que os indícios que serviram de fundamento à denúncia não lograram indicar, nem mesmo minimamente, a participação ou o conhecimento dos fatos supostamente ilícitos pelo acusado detentor da prerrogativa de foro perante a Suprema Corte. Também não foi observada a ritualística procedimental prevista no Código de Processo Penal para a instauração do inquérito policial. Assim, a ausência de liame subjetivo entre o então prefeito e os supostos beneficiários dos recursos públicos, somada à existência de parecer jurídico favorável à homologação da licitação e às indicações de que, no curso da execução do contrato, a própria Administração Pública recusou o pagamento de notas fiscais emitidas pelo suposto beneficiário sem comprovação da entrega dos bens nelas listados, são circunstâncias que ilidem o dolo e a participação do prefeito na prática criminosa.
Sublinhou que o prefeito foi incluído entre os acusados, unicamente, em razão da função pública hierarquicamente superior à dos demais envolvidos, sem indicação mínima de sua participação em prática ilícita, o que evidencia, por conseguinte, violação à responsabilidade penal subjetiva, em contraposição à objetiva, cuja demonstração repele a responsabilidade presumida. Portanto, o recebimento da denúncia quanto ao crime licitatório não observou o direito de resposta preliminar do acusado, previsto em procedimento especial, que prevalece sobre o comum. Consectariamente, reconheceu a extinção da punibilidade do crime definido no art. 90 da Lei 8.666/1993, pois a decisão válida de recebimento da denúncia data de 30.1.2014, quando o delito licitatório já havia sido alcançado pela prescrição, ocorrida em 3.8.2013, considerada a pena máxima em abstrato.
A Turma determinou a remessa dos autos ao juízo de origem, para as providências cabíveis quanto aos demais acusados.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que não acolhia a questão de ordem. Pontuava que o momento processual para examinar a justa causa seria o do recebimento da denúncia, já ocorrido no juízo de origem. Segundo o ministro, as alegações apresentadas na defesa prévia confundem-se com o mérito, sendo descabido apreciá-las nessa fase.
AP 912/PB, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 7.3.2017. (AP-912)
Decisão publicada no Informativo 856 do STF - 2017
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